Atualizado em 11Abr2020
1.
Aspectos introdutórios: os aspectos materiais e os aspectos de
defesa (frutos, produtos, benfeitorias, defesa)
Os
efeitos da posse são os que lhe imprimem cunho jurídico e a
distinguem da mera detenção. Doutrinadores divergem quanto a
determinação dos efeitos, uns admitem uma pluralidade de efeitos da
posse, outros que a posse produz apenas um efeito, o de induzir à
presunção de propriedade.
Savigny
reduziu a dois efeitos específicos e próprios da posse: o usucapião
e a faculdade de invocar os interditos. Já Edmundo Lins e Vicente
Ráo sustentam que apenas a faculdade de invocar os interditos seria
o único efeito da posse, pois a usucapião necessitaria de outros
elementos (27).
Gonçalves
sistematiza os efeitos em: a) a proteção possessória, abrangendo a
autodefesa e a invocação dos interditos; b) a percepção dos
frutos; c) a responsabilidade pela perda ou deterioração da coisa;
d) a indenização pelas benfeitorias e o direito de retenção; e) a
usucapião.
2.
Aspectos materiais
2.1.
Direito à percepção dos frutos e produtos
Pela
teoria objetiva, os frutos são utilidades que a coisa periodicamente
produz, produção normal, ordinária e certa. Na teoria subjetiva,
os frutos são as riquezas produzidas por um bem patrimonial (ex.
safra agrícola).
A
teoria objetiva foi a acolhida pelo Código Civil, produção normal
e periódica da coisa. Dividindo-se em frutos naturais, industriais e
civis. Podendo eles estarem pendentes, percebidos, estantes,
percipiendos ou consumidos.
CC,
Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar,
aos frutos percebidos.
Parágrafo
único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem
ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e
custeio; devem ser também restituídos os frutos colhidos com
antecipação.
CC,
Art. 1.215. Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e
percebidos, logo que são separados; os civis reputam-se percebidos
dia por dia.
CC,
Art. 1.216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos
colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de
perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem
direito às despesas da produção e custeio.
Cessada
a boa-fé, os frutos pendentes e os colhidos por antecipação devem
ser restituídos.
2.2.
Responsabilidade por perda ou deterioração da coisa
O
possuidor de boa-fé não responde pela perda ou deterioração da
coisa, restituirá a coisa no estado em que se encontra, art. 1.217
do CC.
Já
o possuidor de má-fé, responde pela perda ou deterioração da
coisa, ainda que seja acidental, salvo se provar que, do mesmo modo,
se teriam dado, estando ela na posse do reivindicante, art. 1.218,
CC.
2.3.
Indenização pelas benfeitorias
Prevista
no art. 1.219 do CC, consta que o possuidor de boa-fé tem direito à
indenização das benfeitorias necessárias e úteis; quanto às
voluptuárias, se não for pago o valor, o possuidor tem o direito de
levantá-las sem deterioramento da coisa.
Já
o possuidor de má-fé apenas tem direito ao ressarcimento das
benfeitorias necessárias, sem direito de ser indenizado pelas
benfeitorias úteis, nem de o levantar as voluptuárias, art. 1.220,
CC.
2.4.
Direito de retenção
Tem
a finalidade de assegurar o ressarcimento das benfeitorias
necessárias e úteis. Por meio dele, o possuidor conserva a coisa em
seu poder até que indenizado seja do que se lhe deve.
São
pressupostos para o direito de retenção: a detenção da coisa, a
existência de um crédito do retentor e a relação de causalidade
entre esse crédito e a coisa retida.
3.
Defesa da posse
É
uma forma de proteção ao possuidor. Resumindo-se em defesa própria,
ações possessórias típicas e atípicas.
3.1.
Defesa própria ou Autotutela
Nesta,
o possuidor pode manter ou restabelecer a situação de fato pelos
seus próprios recursos. Agindo logo e de forma indispensável para
retomada da posse, por meio da legítima defesa ou do desforço
imediato.
CC,
1.2010, §1º O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou
restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os
atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável
à manutenção, ou restituição da posse.
3.1.2.
Legítima defesa
É
uma defesa direta da qual pode ser utilizada pelo possuidor que é
turbado de sua posse, assemelhando-se à excludente prevista no
Código Penal. Tendo lugar apenas enquanto durar a turbação, e
estando o possuidor na posse da coisa.
3.1.3.
Desforço
Utilizado
nos casos de esbulho da posse. “Ocorre quando o possuidor, já
tendo perdido a posse (esbulho), consegue reagir, em seguida, e
retomar a coisa (28)”.
2.
Ações possessórias típicas (ou Interditos possessórios) ius
possessionis
Criadas
especificamente para a defesa da posse (heterotutela). São a
manutenção da posse, reintegração da posse e o interdito
proibitório. Também chamadas de interdito possessório.
3.2.1.
Aspectos introdutórios – características comuns
É
legitimado para propor interdito o possuidor, já o detentor não tem
essa faculdade. Possuidores diretos e indiretos têm ação
possessória contra terceiros, e também um contra o outro.
CC,
Art. 1.197. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder,
temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a
indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto
defender a sua posse contra o indireto.
Legitimado
passivo também pode ser a pessoa jurídica de direito privado ou
ainda as pessoas jurídicas de direito público.
3.2.1.1.
Fungibilidade
CPC,
art. 554, “a propositura de uma ação possessória em vez de outra
não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção
legal correspondente àquela cujos requisitos estejam provados”.
Desse
modo, se a ação cabível for a de manutenção de posse e o autor
ingressar com ação de reintegração, ou vice-versa, o juiz
conhecerá do pedido da mesma forma e determinará a expedição do
mandado adequado aos requisitos provados (29).
3.2.1.2.
Cumulação de pedidos
É
matéria facultativa e permite-se que o possuidor possa demandar a
proteção possessória e, cumulativamente, pleitear a condenação
do réu nas perdas e danos. Se ocorrer o perecimento, resta pedir
indenização.
CPC,
art. 555, “É lícito ao autor cumular ao pedido possessório o de:
I - condenação em perdas e danos; II - indenização dos frutos.
Parágrafo único. Pode, ainda, imposição de medida necessária e
adequada para: I - evitar nova turbação ou esbulho; II - cumprir-se
tutela provisória ou final.
3.2.1.3.
Caráter dúplice
Ocorre
quando qualquer dos sujeitos pode ajuizar a ação contra o outro. “O
legislador tornou dúplice a ação possessória, permitindo que o
juiz, independentemente de reconvenção do réu, confira-lhe a
proteção possessória, se a requerer na contestação e provar ser
o legítimo possuidor (30)”.
CPC,
art. 556, É lícito ao réu, na contestação, alegando que foi o
ofendido em sua posse, demandar a proteção possessória e a
indenização devida pelos prejuízos resultantes da turbação ou do
esbulho cometido pelo autor.
3.2.1.4.
Distinção entre juízo possessório e juízo petitório. A exceção
de domínio.
Ambas
ações são meios de tutela no qual a possessória discute-se a
posse autônoma, formal, a posse. Já a ação petitória invoca a
posse causal, versa sobre o domínio, sendo secundária a questão da
posse.
Desta
forma apenas por exceção é que se pode trazer a questão do
domínio ao juízo possessório.
Código
de Processo Civil, art. 557, “Na pendência do processo
possessório, é vedado, tanto ao autor quanto ao réu, propor a ação
de reconhecimento do domínio, exceto se a pretensão for deduzida em
face de terceira pessoa”.
3.2.1.5.
Rito processual especial
Dispõe
o art. 558 do Código de Processo Civil: "Regem o procedimento
de manutenção e de reintegração de posse as normas da Seção II
deste Capítulo quando a ação for proposta dentro de ano e dia da
turbação ou do esbulho afirmado na petição inicial. Parágrafo
único. Passado o prazo referido no caput, será comum o
procedimento, não perdendo, contudo, o caráter possessório.”
A
vantagem desse procedimento especial é a previsão da medida liminar
que pode ser concedida quando a ação (de força nova) for intentada
dentro de ano e dia da turbação ou esbulho. Passando desse prazo o
rito será comum e a ação de força velha.
3.2.2.
Modalidades (Interdito possessório) das ações possessórias
típicas
São
modalidades a manutenção de posse, a reintegração de posse e o
interdito proibitório.
A
diferença entre manutenção e reintegração de posse é que o
possuidor tem o direito de ser mantido na posse em caso de turbação
(continua na posse) e reintegrado no de esbulho (privação da
posse).
CC,
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de
turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência
iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
3.2.2.1.
Manutenção de posse (Washington de Barros)
CC,
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de
turbação,…
Turbação
de fato é a agressão material dirigida contra a posse. Distingui-se
do esbulho porque na turbação o possuidor continua na posse dos
bens, apenas tem cerceado seu exercício. Turbação de direito é o
réu contestando judicialmente a posse do autor.
Distinção
feita por Câmara Leal:
− Turbação
direta: é a que se exercita imediatamente sobre a coisa, objeto da
posse;
− Turbação
indireta: é a praticada externamente, mas que repercute sobre a
coisa possuída, produzindo efeitos nocivos ao exercício da posse
pelo titular desta;
− Turbação
positiva: é a que resulta da prática de atos materiais equivalentes
ao exercício da posse sobre a coisa, por parte do turbador;
− Turbação
negativa: é quando dificulta ou embaraça a pela atividade
possessória do possuidor.
Requisitos
da ação de manutenção de posse a ser comprovados pelo autor (CPC,
art. 561):
− A
sua posse;
− A
turbação praticada pelo réu;
− A
data da turbação;
− A
continuação da posse, embora turbada.
O
autor pode requerer desde logo que seja mantido na posse. O juiz pode
conceder de plano o mandado ou exigir a prévia justificação do
alegado. Já o prazo para contestação inicia-se a partir da
intimação do despacho que concedeu ou denegou a liminar.
Contra
pessoas jurídicas de direito público não se defere manutenção
liminar sem prévia audiência entre as partes. E o autor pode
cumular pedido possessório com a cominação de pena para caso de
nova turbação ou esbulho.
“Tem
sido objeto de controvérsias a questão relativa à contagem do
prazo de ano e dia na referida ação, quando continuada a turbação,
ou reiterados os atos turbativos. Entendem uns que o prazo deve ser
contado do primeiro ato turbativo, opinando outros, contrariamente,
que dos últimos se deve contar o lapso extintivo”.
3.2.2.2.
Reintegração de posse (Washington de Barros)
CC,
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de
turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência
iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
Os
pressupostos do processo judicial de reintegração de posse estão
expressos no art. 561 Novo Código de Processo Civil.
“Incumbe
ao autor provar: I - a sua posse; II - a turbação ou o esbulho
praticado pelo réu; III - a data da turbação ou do esbulho; IV - a
continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou
a perda da posse, na ação de reintegração”.
“Esbulho
é o ato pelo qual o possuidor se vê privado da posse, violenta ou
clandestinamente, e ainda por abuso de confiança”. Caracteriza-se
também por toda e qualquer moléstia aos direitos do possuidor.
Exemplo:
− Estranho
que invade casa deixada por inquilino, comete esbulho;
− Comodatário
que deixa de entregar a coisa dada em comodato, findo o prazo ou, sem
este, a pedido do comodante;
− Compromissário-comprador
deixa de pagar as prestações avençadas;
− Locador
de serviços, dispensado pelo patrão, não restitui a casa que
recebera para moradia;
Assim
como na turbação, o esbulho deve datar de menos de ano e dia. É
por esse prazo extintivo que se estabelece a distinção entre as
ações de força nova e de força velha. Apenas na primeira tem
cabimento a expedição de mandado liminar de manutenção ou de
reintegração.
O
prazo de decadência começa a fluir a partir do primeiro ato que
acarreta a perda da posse.
3.2.2.3.
Interdito proibitório (Washington de Barros)
É
a proteção preventiva da posse, na iminência ou sob ameaça de ser
molestada. Está regulamentado pelos artigo 561 e 567 do NCPC.
Recebendo
a petição inicial, vem a contestação, inexiste concessão de
mandado initio litis tuituvo da posse, apenas depois de
julgada a ação pode o juiz proibir o réu de praticar o ato sob
pena de pagar pena pecuniária.
Prevalece
o entendimento de que o interdito pode ser impetrado contra a
administração pública, com base no art. 562, parágrafo único do
NCPC. A rigor, seria mais adequada a impetração do mandado de
segurança contra a autoridade responsável.
Importante
lembrar que a propositura de uma ação possessória em vez de outra
não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção
legal correspondente àquela, cujos requisitos estejam provados (art.
554 NCPC).
3.3.
Ações possessórias atípicas (Washington de Barros)
São
a imissão de posse, ação de nunciação de obra nova, ação de
dano efetivo, ação de embargos de terceiros.
3.3.1.
Ação de imissão de posse
É
uma das modalidades do interdito adipiscendae possessionis do
direito romano. O atual Código de Processo Civil não previu de modo
específico a antiga ação de imissão de posse. “Acredito
realmente que o autor possa promovê-la, desde que imprima ao feito o
rito comum (ação ordinária de imissão de posse) e que terá por
objeto a obtenção da posse nos casos legais”.
Na
imissão discute-se o domínio e o requisito da posse inexiste.
No
ensinamento de Pontes de Miranda, as ações de imissão de posse não
são, nem nunca foram, possessórias. Mas revestem-se desta
característica por ter como objeto a aquisição da posse pela via
judicial.
3.3.2.
Ação de nunciação de obra nova
Compete
essa ação a quem considere prejudicial ao seu domínio, ou posse,
obra nova em vias de conclusão no prédio vizinho. Seu objetivo é
impedir que o prejuízo se consuma pela ultimação da obra. Deve ser
requerida antes de terminada a obra.
3.3.3.
Ação de dano infecto (Gonçalves)
Também
chamado de dano iminente, tem caráter preventivo e cominatório,
como o interdito proibitório. Pode ser oposta no caso de fundado
receio de dano iminente.
CC,
art. 1.280. O proprietário ou o possuidor tem direito a exigir do
dono do prédio vizinho a demolição, ou a reparação deste, quando
ameace ruína, bem como que lhe preste caução pelo dano iminente.
É
legitimado ativo o proprietário ou possuidor, e passivo, o dono do
prédio vizinho que provoca a interferência prejudicial.
3.3.4.
Ação de embargos de terceiros
Embora
não esteja no CPC presente no capítulo de ações possessórias, é
inquestionável que tal remédio, quando empregado para defesa da
posse, reveste-se de caráter possessório.
“Tem
como pressuposto essencial o ato de apreensão judicial praticado em
detrimento do terceiro embargante”.
NCPC.
Art. 674. Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou
ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha
direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu
desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro.
§
1º Os embargos podem ser de terceiro proprietário, inclusive
fiduciário, ou possuidor.
§
2º Considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos:
I
- o cônjuge ou companheiro, quando defende a posse de bens próprios
ou de sua meação, ressalvado o disposto no art. 843;
II
- o adquirente de bens cuja constrição decorreu de decisão que
declara a ineficácia da alienação realizada em fraude à execução;
III
- quem sofre constrição judicial de seus bens por força de
desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não
fez parte;
IV
- o credor com garantia real para obstar expropriação judicial do
objeto de direito real de garantia, caso não tenha sido intimado,
nos termos legais dos atos expropriatórios respectivos.
Cabe
ao terceiro defender seu domínio e posse. Os embargos serão
admissíveis em qualquer tempo, antes da sentença final. Ou na
execução, até cinco dias depois da arrematação, adjudicação ou
remição.
27
Entendimento de Washington de Barros, pág 110
28
Gonçalves, 2012, pág. 275
29
Gonçalves, 2012, pág. 286
30
Gonçalves, 2012, pág. 293
_________________________________________________________
- Referência
GONÇALVES,
Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 5 : direito das
coisas. 7. ed. – São Paulo : Saraiva, 2012.
MONTEIRO,
Washington de Barros, 1910-1999, MALUF, Carlos Alberto Dabus. Curso
de direito civil, 3 : direito das coisas , 42. ed. - São Paulo:
Saraiva, 2012.
Bons
estudos!
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