quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Direito Penal II - Aula 11 - Concurso de crimes - material, formal e crime continuado

Concursos de crimes

     Concurso de pessoas acontece quando duas ou mais pessoas se reúnem para cometer o crime, existe também a possibilidade de uma mesma pessoa cometer dois ou mais crimes, é o chamado concursos de crimes - concursus delictorum. 

     O concurso de crimes pode ser concurso material, concurso formal ou crime continuado. "Pode ocorrer entre crimes de qualquer espécie, comissivos ou omissivos, dolosos ou culposos, consumados ou tentados, simples ou qualificados e ainda entre crimes e contravenções" (BITENCOURT, 2009, pág. 643).

Concurso material 

     Concurso material ocorre quando um indivíduo mediante duas ou mais ações ou omissões venha a praticar dois ou mais delitos. Sendo esses crimes homogêneos (idênticos) ou heterogênios (diferentes). Os sistema de aplicação da pena é o de cúmulo material, nele a penas dos crimes são somadas.

     "No concurso material há pluralidade de condutas e pluralidade de crimes. Quando os crimes praticados forem idênticos ocorre o concurso material homogêneo (dois homicídios) e quando os crimes praticados forem diferentes caracterizar-se-á o concurso material heterogêneo (estupro e homicídio)" (BITENCOURT, 2009, pág. 644).

     Como exemplo, um indivíduo invade uma casa para roubar, aproveita e estupra a dona da casa. Temos aí duas ações, que são o furto e o estupro; são crimes distintos, portanto, heterogêneos. O juíz soma a pena de furto (reclusão, de um a quatro anos, e multa) com a de estupro (reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos), totalizando 5 anos (supondo que aplicou a pena mínima de cada tipo penal). Depois de somar as penas, o juiz verifica se há possibilidade da substituição da pena.

     Primeiramente cumpre-se a pena de reclusão e depois a de detenção, mas segundo Sica, "é irrelevante, pois na prática não há mais qualquer distinção entre reclusão e detenção". (SICA, 2013, pág. 120).

     Concluindo, quando se fala em concurso de crimes tem-se a certeza da pluralidade de delitos, e o cerne desse assunto é o número de ações ou omissões.


Concurso material
CP, Art. 69 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela. §1º - Na hipótese deste artigo, quando ao agente tiver sido aplicada pena privativa de liberdade, não suspensa, por um dos crimes, para os demais será incabível a substituição de que trata o art. 44 deste Código. §2º - Quando forem aplicadas penas restritivas de direitos, o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais.
Rehabilitação
CP, Art. 119 - No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente.


Concurso formal 

     É aquele em que o indivíduo praticou apenas uma ação ou omissão, e dela adveio dois ou mais delitos idênticos ou não. Sendo esses crimes homogêneos ou heterogênios. O sistema de aplicação da pena para o concurso formal próprio é o da exasperação, no qual aplica-se a pena mais grave aumentada de 1/6 até a metade, e no concurso formal impróprio aplica-se o cúmulo material.

     "Nessa espécie de concurso há unidade de ação e pluralidade de crimes... O concurso formal pode ser próprio (perfeito) quando a unidade de comportamento corresponde à unidade interna da vontade do agente, ..., e também pode ser impróprio (imperfeito), quando o agente deseja a realização de mais de um crime, tem consciência e vontade em relação a cada um deles" (BITENCOURT, 2009, pág. 644).

     Como exemplo, um sujeito dirigindo, dentro do limite de velocidade e sem estar bêbado, por negligência na ultrapassagem ocasionou um acidente e os três passageiros que com ele estavam, morreram. Uma ação e três crimes idênticos de homicídio culposo - detenção, de um a três anos, o juiz deverá considerar apenas um crime e acrescentar de 1/6 até 1/2 da pena; considerando que a pena aplicada foi a mínima de 1 ano, esta poderia variar de 1 ano e 2 meses à 1 ano e 6 meses.

     Outra situação para concurso formal é a de um sujeito armado, atira em Arnaldo querendo matá-lo, a bala atravessa Arnaldo, o qual morre, e atinge Bento, que ficou com lesão corporal. Uma ação e dois crimes diferentes, um homicídio doloso contra Arnaldo e lesão corporal culposa contra Bento; nessa situação o juiz deverá pegar a pena mais grave e acrescentar de 1/6 até 1/2. Pena do homicídio - reclusão de 6 (seis) a 20 (vinte) anos, pena da lesão corporal - detenção de 2 (dois) meses a 1 (um) ano. Supondo que o sujeito foi condenado à pena mínima do crime mais grave, ou seja, 6 anos por homicídio, o sujeito ficará recluso entre 7 e 9 anos, a depender do que será acrescido na pena (1/6 até 1/2).

     E por último, a situação de um sujeito que, querendo matar outras pessoas, as enfileira para economizar a bala, nota-se aqui o desígnio autônomo, a vontade de matar todos, nesse caso as penas serão somadas, aplica-se como se fosse concurso material, mas a pena não pode ser maior que as penas de cada crime somadas.
 

CP, Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior. Parágrafo único - Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código.


Crime continuado 

     Existem algumas teorias para explicar a natureza jurídica do crime continuado, são elas: a teoria da unidade real, a teoria da ficção jurídica, a teoria da unidade jurídica ou mista. Nosso Código Penal adotou a teoria da ficção jurídica, na qual "a unidade delitiva é uma criação da lei, pois na verdade existem vários delitos... Essa ficção resulta de uma transação entre a coerência lógica, a utilidade e a equidade" (BITENCOURT, 2009, pág. 646).

     "O crime continuado é uma ficção jurídica concebida por razões de política criminal, que considera que os crimes subsequentes devem ser tidos como continuação do primeiro, estabelecendo, em outros termos, um tratamento unitário a uma pluralidade de atos delitivos, determinando uma forma especial de puni-los" (BITENCOURT, 2009, pág. 645).

     Sendo assim, torna-se mais benéfico para o condenado, por ser considerado como sendo apenas um crime. Deve-se ter o cuidado para não confundir com o crime material, pois embora também seja por mais de uma ação ou omissão venha a cometer dois mais crimes, no crime continuado os delitos são da mesma espécie, e ainda traz requisitos cumulativos que são: praticar nas mesmas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes e os crimes subsequentes serem continuação do primeiro.

     Analisando os requisitos do crime continuado, o agente deverá ter mais de uma ação ou omissão; quanto aos crimes serem da mesma espécie, existe uma convergência doutrinária, a majoritária acredita que crimes da mesma espécie são os que figuram dentro da mesma figura típica, por exemplo Furto, artigos 155 e 156. O código não explica quais são os crimes da mesma espécie, mas para o STF, os crimes da mesma espécie são os que estão no mesmo artigo, é o mesmo tipo e as derivações daquele tipo.

     A prática deve ser verificada no mesmo tempo, lugar e mesmas condições ou semelhantes. STF interpreta como mesma condição de tempo, são crimes cometidos embora espaçadamente da mesma espécie não passe de 30 dias. "Deve existir uma certa periodicidade que permita observar-se um certo ritmo, uma certa uniformidade, entre as ações sucessivas, embora não se possam fixar, a respeito, indicações precisas" (BITENCOURT, 2009, pág. 648).

     A maneira de agir deve ser igual. "Maneira de execução é o modo, a forma, o estilo de praticar o crime, que, na verdade, é apenas mais um dos requisitos objetivos da continuação criminosa". (BITENCOURT, 2009, pág. 649).

     Mesma condições e lugar pode ser em comarcas contíguas, próximas. Exemplo, uma quadrilha que roubava bancos em SP e em MG, embora comarcas diferentes mas como são próximas, pode ser considerado como mesmo lugar para fins de continuidade de crime.

     Para aplicação da pena, pega a mais grave e acresce de 1/6 a 2/3, e no caso de crime doloso cometido com violência ou grave ameaça, a pena pode ser triplicada.
 

CP, Art. 71. - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. §ú - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código.
Súmula 711 - STF - A lei pena mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.
Súmula 497 - STF - Quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação.



Ver arts. 69, 70 e 71 do CP

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  • Referência
- BITENCOURT, Cezar Roberto, Tratado de direito penal, volume 1: parte geral, 14ª ed rev., atual. e ampl. - São Paulo: Saraiva, 2009
- Aula 02/009/2013, Direito Penal II - Das penas, Profº Sandresson, com anotações de Régia Carvalho

  • Leia mais 
 - Coletânea Temática de Jurisprudência: Matéria Penal

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