quarta-feira, 29 de julho de 2020

Cessão de direitos hereditários

1. Considerações gerais

     Primeiramente é necessário esclarecer os termos estudados. Iniciando pela palavra "ceder", a qual significa transferir, dar, entregar algo a alguém. Já "direitos hereditários" significa os direitos sobre uma herança.

     A herança trata-se de um patrimônio (incluindo bens, direitos e dívidas) que é deixado por alguém quando falece (chamado de cujus). Dessa forma, "ceder os direitos hereditários" significa transferir para alguém os direitos sobre uma herança.

     O patrimônio deixado pelo de cujos é considerado um bem indivisível quanto à posse e à propriedade. Ela é transmitida como um todo unitário ainda que existam vários herdeiros e é regulada pelas normas relativas ao condomínio. Diante disso, até o momento da partilha, nenhum herdeiro tem a propriedade ou posse exclusiva sobre qualquer bem.

     Além disso, o direito à sucessão aberta é considerado um bem imóvel por determinação legal (art. 80, II, CC) e pode ser objeto de cessão conforme artigo 1.793, CC.

     Esclarecendo os termos do artigo 1.793, em comento, denomina-se "direito à sucessão aberta" quando o herdeiro ainda não declarou, expressa ou tacitamente, se aceita a herança; já a expressão "quinhão de que dispões o herdeiro" é chamada quando o herdeiro já tiver aceitado a herança.

    Acrescenta-se que o que se considera imóvel é o direito à herança com uma unidade abstrata, e não à um bem ou aos bens em si. Apenas depois da partilha é que se considera os bens individualmente.

     Importa também saber que a abertura da sucessão ocorre automaticamente com a morte de uma pessoa. A partir daí os sucessores tem um prazo legal para abrir o inventário o qual é concluído com a partilha dos bens.


2. Conceito

     A cessão dos direitos hereditários é um negocio jurídico inter vivos que só pode ser celebrado após a abertura da sucessão, mesmo que o inventário não tenha sido aberto, e enquanto não for ultimada a partilha.

     Por se constituir de um bem imóvel, de conteúdo econômico, o direito à sucessão aberta pode ser transmitido mediante cessão, como um ato negocial inerente ao domínio dos bens e realizado por quaisquer dos herdeiros.
“O direito à sucessão aberta, portanto, como qualquer direito patrimonial de conteúdo econômico, pode ser transferido mediante cessão.”Trecho de: Carlos Roberto Gonçalves. “Direito Civil Brasileiro - Vol. 7”. iBooks.

2. Requisitos, forma e objeto

     Conforme a doutrina estudada, para realizar a cessão é preciso:

a) Inexistência de cláusula de inalienabilidade sobre os bens;
b) Outorga uxória ou marital (art. 1.647 caput e inciso I e art. 166, IV, CC), exceto se casados sobre regime da separação convencional;
c) Agente capaz e ter a condição de herdeiro;
d) Ser realizada entre a data da abertura da sucessão e até antes da partilha;

     Quanto à forma, por se tratar de um bem imóvel por determinação legal, a cessão dos direitos hereditários deve ser realizada por escritura pública sob pena de nulidade por desrespeito à forma e ser feito o registro do ato para bens imóveis sob pena de ineficácia perante terceiros ou erga omnes.

     A cessão pode ser gratuita ou onerosa. Sendo gratuita toma a forma de doação e se for onerosa, compra e venda.

     O objeto do contrato são os direitos hereditários. Dessa forma, a cessão engloba apenas os direitos hereditários e não abrange os deveres jurídicos que decorrem da transmissão sucessória.

     Diante do seu caráter aleatório, a cessão garante a existência do direito cedido, porém não a sua extensão ou a quantidade dos bens. Por isso que o cedente não responde pela evicção.

     O cessionário assume o lugar e a posição jurídica do cedente sub-rogando-se em todos os direitos e obrigações.

     Sobre a ineficácia da cessão de direitos hereditários, ela se dará quando feita sobre bem singularmente considerado ou sobre um bem indivisível do acervo sem a prévia autorização do juiz. No entanto, se o cedente especificar algum bem e os demais coerdeiros concordarem, o bem pode fazer parte da quota do cessionário.

     Se houver substituição ou direito de acrescer em favor do cedente após ter havido a cessão dos direitos hereditários, os direitos acrescidos não são abrangidos no ato de alienação do quinhão hereditário (art. 1.793, §1º, CC).


3. Direito de preferência

     O direito de preferência aplica-se nas cessões onerosas. Nos casos de cessões gratuitas ou cedidas a outro coerdeiro não há que se falar em direito de preferência.

     Tal instituto está previsto nos artigos 1.794 e 1.795 e parágrafo único do CC. E regula que, se outro herdeiro quiser a quota hereditária, desde que pague o valor, terá preferência sobre a pessoa estranha à sucessão.

     No caso de o herdeiro tomar ciência da cessão feita a pessoa estranha à sucessão depois de realizada a transferência, ele terá o prazo de 180 dias para depositar o preço e requerer para si o objeto da cessão. Ou ainda, pode haver a distribuição do quinhão cedido, na proporção das respectivas quotas hereditárias, quando vários herdeiros puderem exercer o direito de preferência.

 
4. Cessão de direitos hereditários e venda de bens hereditários

     Existe uma diferença entre cessão da herança e a venda de bens hereditários a qual se constitui na natureza do contrato. A cessão de herança está relacionada à parte ideal (1/2, 1/4, etc), já a venda de bens hereditários recai sobre um bem determinado.


5. Tributos aplicáveis

     À cessão de direitos hereditários à título oneroso, por se tratar de uma transmissão de bens inter vivos, aplica-se o Imposto de Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis - ITIV de competência Municipal (art. 156, II da CF), tendo como contribuinte o cessionário do bem ou direitos transmitidos.

     Caso seja realizada à título gratuito, toma a forma de doação e sobre ela incidirá o Imposto de Transmissão por Doação de quaisquer bens ou direitos - ITCD, de competência Estadual.

     As alíquitoas desses tributos variam entre os Estados e entre os Municípios. OS limites máximos são fixados pelo Senado Federal.


6. Texto da lei

CÓDIGO CIVIL


Art. 80. Consideram-se imóveis para os efeitos legais:
(...)
II - o direito à sucessão aberta

Da Herança e de sua Administração
Art. 1.791. A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros.
Parágrafo único. Até a partilha, o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio.
Art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demostrando o valor dos bens herdados.
Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.
§ 1 o Os direitos, conferidos ao herdeiro em conseqüência de substituição ou de direito de acrescer, presumem-se não abrangidos pela cessão feita anteriormente.
§ 2 o É ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerado singularmente.
§ 3 o Ineficaz é a disposição, sem prévia autorização do juiz da sucessão, por qualquer herdeiro, de bem componente do acervo hereditário, pendente a indivisibilidade.
Art. 1.794. O co-herdeiro não poderá ceder a sua quota hereditária a pessoa estranha à sucessão, se outro co-herdeiro a quiser, tanto por tanto.
Art. 1.795. O co-herdeiro, a quem não se der conhecimento da cessão, poderá, depositado o preço, haver para si a quota cedida a estranho, se o requerer até cento e oitenta dias após a transmissão.
Parágrafo único. Sendo vários os co-herdeiros a exercer a preferência, entre eles se distribuirá o quinhão cedido, na proporção das respectivas quotas hereditárias.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
(...)
II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;



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REFERÊNCIAS:

AMORIM, Sebastião. OLIVEIRA, Euclides. Capítulo 1 - Sucessão Hereditária , itm 8 Cessão de Herança. Renúncia translativa. Formalização. Renúncia à meação. Registro da cessão de herança in Inventário e partilha: teoria e prática. 25 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. págs. 65 a 72.


CARVALHO, Luis Batista Pereira de. JUNQUEIRA, Gabriel José Pereira. Capítulo V Ordem da vocação hereditária ou ordem hereditária - cessão de direitos hereditários in Manual prático de inventários e partilhas. 14. ed. Leme/SP: Mundo jurídico, 2018. Págs. 130 a 133.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Capítulo II - Da herança e de sua administração, item 4 - Cessão de direitos hereditários in Direito civil brasileiro, volume 7: direito das sucessões. 6. ed. - São Paulo: Saraiva, 2012. Ebook.

LEI MUNICIPAL. NATAL/RN. Decreto nº 11.089 de 2 de setembro de 2016. Dá nova redação ao Decreto nº 9.795 de 14 de setembro de 2012 que aprovou o Regulamento do Imposto sobre a Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis - ITVI.

RICARDO, Alexandre. Capítulo 13 - Impostos previstos na Constituição Federal. in Direito Tributário Esquematizado. 4. ed. -Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: Método, 2010. pág. 583 a 589 e 633 a 639.

TARTUCE, Flávio. Capítulo 1 - Direito das sucessões. Conceitos fundamentais e regras gerais, item 1.8 Da herança como bem imóvel e indivisível. A cessão de direitos hereditários in Direito Civil: direito das sucessões - v. 6. 12. ed. - Rio de Janeiro: Forence, 2019. pág. 86 a 96.


Bons estudos!


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