sexta-feira, 18 de abril de 2014

Direito Civil III - Lição 10 - Contrato de Compra e Venda (Cont.)

5. Regras especiais da compra e venda

5.1 Venda por amostra, por protótipos ou por modelos (art. 484 do CC)

a.      Conceitos

- Amostra: reprodução perfeita e corpórea de uma coisa determinada.
- Protótipo: primeiro exemplar de uma coisa criada (invenção)
- Modelo: uma reprodução exemplificativa da coisa, por desenho ou imagem, acompanhada de uma descrição detalhada.

     Funciona sob condição suspensiva, só ocorre o aperfeiçoamento do negócio com a tradição na qualidade esperada. Pois prevalece a amostra, o protótipo ou o modelo, havendo contradição ou diferença em relação ao modo de descrição da coisa no contrato.

     Venda de bens móveis por amostra, protótipos ou modelos, presume-se que serão entregues conforme a qualidade prometida. Se não estiver conforme, o contrato de compra e venda poderá ser desfeito (condição resolutiva).

CC, Art. 484. Se a venda se realizar à vista de amostras, protótipos ou modelos, entender-se-á que o vendedor assegura ter a coisa as qualidades que a elas correspondem.
Parágrafo único. Prevalece a amostra, o protótipo ou o modelo, se houver contradição ou diferença com a maneira pela qual se descreveu a coisa no contrato.


5.2 Venda a contento ou sujeita à prova (Art. 509 a 512 do CC)

a.      Aperfeiçoamento

     Se dá quando o comprador se declarar satisfeito com o bem a ser adquirido (condição suspensiva), enquanto isso a coisa pertence ao vendedor.

b.      A tradição

     Não gerará a transferência da propriedade, mas tão somente a da posse direta.

c.      Direito personalíssimo

     A venda a contento gera um direito personalíssimo, não se transmite aos sucessores do comprador por ato inter vivos ou causa mortis, sendo que o falecimento do comprador extingue tal direito.

d.      Prazo

     Sem prazo convencionado para manifestação do comprador, o vendedor terá direito de intimá-lo, judicial ou extrajudicialmente.

e.      Diferença entre venda a contento e sujeita à prova

     Na venda a contento o comprador não conhece o bem, havendo uma aprovação inicial;

     Na venda sujeita à prova (condição suspensiva), a coisa já é conhecida. As qualidades devem ser asseguradas pelo vendedor e que seja idôneo para o fim que se destina.

CC, Da Venda a Contento e da Sujeita a Prova 
Art. 509. A venda feita a contento do comprador entende-se realizada sob condição suspensiva, ainda que a coisa lhe tenha sido entregue; e não se reputará perfeita, enquanto o adquirente não manifestar seu agrado.
Art. 510. Também a venda sujeita a prova presume-se feita sob a condição suspensiva de que a coisa tenha as qualidades asseguradas pelo vendedor e seja idônea para o fim a que se destina.
Art. 511. Em ambos os casos, as obrigações do comprador, que recebeu, sob condição suspensiva, a coisa comprada, são as de mero comodatário, enquanto não manifeste aceitá-la.
Art. 512. Não havendo prazo estipulado para a declaração do comprador, o vendedor terá direito de intimá-lo, judicial ou extrajudicialmente, para que o faça em prazo improrrogável.


5.3 Venda por medida, por extensão ou ad mensuram (art. 500 do CC)

a.      Bem imóvel

- Partes estipulam o preço por medida de extensão;
- Medida é condição essencial ao contrato efetivado (venda ad mensuram);

b.      Variação da extensão

- Admite-se variação da área de até 1/20 (um vigésimo), ou seja, 5% (cinco por cento);
- Presunção relativa de que a variação é tolerável pelo comprador;
- Comprador pode provar o contrário, requerer aplicação das regras do vício redibitório se houver variação superior ao tolerável;

c.      Comprador prejudicado pode exigir:

- Complementação da área, por ação ex empto;
- Abatimento proporcional no preço, por ação quanti minoris;
- Resolução do contrato, com a devolução do que foi pago, por ação redibitória;
- Perdas e danos, se comprovar má-fé do alienante;

d.      Vendedor prejudicado, o comprador pode:

- Completar o valor correspondente ao preço;
- Devolver o excesso;

e.      Prazo para ingressar com as ações

- Decadencial;
- 1 (um) ano;

f.      Venda ad corpus

- Imóvel vendido como coisa certa e discriminada
- Não cabe os pedido de comprador ou vendedor que se sinta prejudicado conforme acima;

CC, Art. 500. Se, na venda de um imóvel, se estipular o preço por medida de extensão, ou se determinar a respectiva área, e esta não corresponder, em qualquer dos casos, às dimensões dadas, o comprador terá o direito de exigir o complemento da área, e, não sendo isso possível, o de reclamar a resolução do contrato ou abatimento proporcional ao preço. 
§ 1o Presume-se que a referência às dimensões foi simplesmente enunciativa, quando a diferença encontrada não exceder de um vigésimo da área total enunciada, ressalvado ao comprador o direito de provar que, em tais circunstâncias, não teria realizado o negócio. 
§ 2o Se em vez de falta houver excesso, e o vendedor provar que tinha motivos para ignorar a medida exata da área vendida, caberá ao comprador, à sua escolha, completar o valor correspondente ao preço ou devolver o excesso. 
§ 3o Não haverá complemento de área, nem devolução de excesso, se o imóvel for vendido como coisa certa e discriminada, tendo sido apenas enunciativa a referência às suas dimensões, ainda que não conste, de modo expresso, ter sido a venda ad corpus.


5.4 Venda de coisas conjuntas (Art. 503 do CC)

     Dispositivo inspirado no princípio da conservação negocial, cabe ação redibitória especificamente à coisa viciada.

a.     Não deve ser aplicado:

- para casos de venda coletiva, na qual as coisas vendidas constituem um todo só.
- casos em que os bens defeituosos se acumulam ou se avultam;
- ou se o vício de um deles gera depreciação significativa do conjunto;

CC, Art. 503. Nas coisas vendidas conjuntamente, o defeito oculto de uma não autoriza a rejeição de todas.


6. Das cláusulas especiais da compra e venda

a.     Conceito

     As cláusulas especiais são previsões que alteram os efeitos da compra e venda e devem constar expressamente no instrumento, para terem eficácia, são elas:

- cláusula de retrovenda (art. 505 a 508, CC);
- cláusula de venda a contento e cláusula de venda sujeita à prova (art. 509 a 512, CC);
- cláusula de preempção ou preferência (art. 513 a 520, CC);
- cláusula de venda com reserva de domínio (art. 521 a 528, CC);
- cláusula de venda sobre documentos (art. 529 a 532, CC)

6.1 Cláusula de retrovenda (pactum de retrovendendo ou cláusula de resgate)

a.     Conceito

     Confere ao vendedor o direito de desfazer a venda, reavendo de volta o bem alienado dentro do prazo máximo de três anos (prazo decadencial).

- Admissível nas vendas de bens móveis;
- Cláusula resolutiva expressa;
- Prazo: máximo de 3 anos, pode ser prazo menor;
- Início do prazo da data que se concluiu o contrato;

b.     Ação de resgate

- comprador se recusar a receber as quantias, o vendedor depositará judicialmente;
- ação constitutiva positiva;
- se depósito insuficiente, vendedor só terá restituído o domínio da coisa, quando pagar integralmente;
- pode ser exercida por herdeiros e legatários (transmissibilidade causa mortis), em relação ao terceiro adquirente. Há dúvidas quanto à transmissão inter vivos.

CC, Da Retrovenda
Art. 505. O vendedor de coisa imóvel pode reservar-se o direito de recobrá-la no prazo máximo de decadência de três anos, restituindo o preço recebido e reembolsando as despesas do comprador, inclusive as que, durante o período de resgate, se efetuaram com a sua autorização escrita, ou para a realização de benfeitorias necessárias.
Art. 506. Se o comprador se recusar a receber as quantias a que faz jus, o vendedor, para exercer o direito de resgate, as depositará judicialmente.
Parágrafo único. Verificada a insuficiência do depósito judicial, não será o vendedor restituído no domínio da coisa, até e enquanto não for integralmente pago o comprador.
Art. 507. O direito de retrato, que é cessível e transmissível a herdeiros e legatários, poderá ser exercido contra o terceiro adquirente.
Art. 508. Se a duas ou mais pessoas couber o direito de retrato sobre o mesmo imóvel, e só uma o exercer, poderá o comprador intimar as outras para nele acordarem, prevalecendo o pacto em favor de quem haja efetuado o depósito, contanto que seja integral.


6.2 Cláusula de preempção, preferência ou prelação convencional

a.     Conceito

     É aquela pela qual o comprador de um bem móvel ou imóvel terá a obrigação de oferecê-lo a quem lhe vendeu, por meio de notificação judicial ou extrajudicial, para que este use do seu direito de prelação em igualdade de condições.

     Aplica-se aos casos de venda e dação em pagamento.

     Intransmissível por causa mortir ou ato inter vivos.

b. Prazo para exercer o direito de preferência

- 180 dias para bens móveis;
- 2 anos para bens imóveis;
- contados da datada realização da venda original;
- prazos podem ser reduzidos (há controvérsia);
- Manifestação do vendedor originário:
     * prazo decadencial, contado a partir da notificação;
     * 3 dias, se a coisa for móvel;
     * 60 dias, se a coisa for imóvel;

c.     Direito de preempção é indivisível 

CC, Art. 517. Quando o direito de preempção for estipulado a favor de dois ou mais indivíduos em comum, só pode ser exercido em relação à coisa no seu todo. Se alguma das pessoas, a quem ele toque, perder ou não exercer o seu direito, poderão as demais utilizá-lo na forma sobredita. 

d.      Perdas e danos

- O vendedor preterido no seu direito de preferência, pode pleitear perdas e danos, inclusive do adquirente de má-fé;
- Não cabe ação adjudicatória como na prelação legal;
- Prazo prescricional de 3 anos, inicia do surgimento da pretensão, outros dizem que inicia a ciência do fato;

Obs.:

* Preempção legal (Art. 504, CC) - a favor de condôminos cabe anulação da compra e venda. Prazo decadencial de 180 dias. Efeito erga omnes.

* Preempção convencional (Art. 513 a 520, CC), cabem perdas e danos. Prazo prescricional de 3 anos. Efeitos inter partes.

CC, Da Preempção ou Preferência 
Art. 513. A preempção, ou preferência, impõe ao comprador a obrigação de oferecer ao vendedor a coisa que aquele vai vender, ou dar em pagamento, para que este use de seu direito de prelação na compra, tanto por tanto.
Parágrafo único. O prazo para exercer o direito de preferência não poderá exceder a cento e oitenta dias, se a coisa for móvel, ou a dois anos, se imóvel.
Art. 514. O vendedor pode também exercer o seu direito de prelação, intimando o comprador, quando lhe constar que este vai vender a coisa.
Art. 515. Aquele que exerce a preferência está, sob pena de a perder, obrigado a pagar, em condições iguais, o preço encontrado, ou o ajustado.
Art. 516. Inexistindo prazo estipulado, o direito de preempção caducará, se a coisa for móvel, não se exercendo nos três dias, e, se for imóvel, não se exercendo nos sessenta dias subseqüentes à data em que o comprador tiver notificado o vendedor.
Art. 517. Quando o direito de preempção for estipulado a favor de dois ou mais indivíduos em comum, só pode ser exercido em relação à coisa no seu todo. Se alguma das pessoas, a quem ele toque, perder ou não exercer o seu direito, poderão as demais utilizá-lo na forma sobredita.
Art. 518. Responderá por perdas e danos o comprador, se alienar a coisa sem ter dado ao vendedor ciência do preço e das vantagens que por ela lhe oferecem. Responderá solidariamente o adquirente, se tiver procedido de má-fé.
Art. 519. Se a coisa expropriada para fins de necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, não tiver o destino para que se desapropriou, ou não for utilizada em obras ou serviços públicos, caberá ao expropriado direito de preferência, pelo preço atual da coisa.
Art. 520. O direito de preferência não se pode ceder nem passa aos herdeiros.


6.3 Cláusula de venda sobre documentos

a.     Conceito

    Quem tem por objeto bens móveis, a tradição é substituída pela entrega do documento correspondente à propriedade, geralmente o título representativo do domínio.

- Há uma tradição simbólica (traditio longa manus);

- O pagamento deve ocorrer na data e no lugar da entrega do documento (locus regit actum);

- Havendo apólice de seguro, para cobrir os riscos de transporte, o prêmio deve ser pago pelo comprador, salvo má-fé do vendedor;

CC, Da Venda Sobre Documentos
Art. 529. Na venda sobre documentos, a tradição da coisa é substituída pela entrega do seu título representativo e dos outros documentos exigidos pelo contrato ou, no silêncio deste, pelos usos.
Parágrafo único. Achando-se a documentação em ordem, não pode o comprador recusar o pagamento, a pretexto de defeito de qualidade ou do estado da coisa vendida, salvo se o defeito já houver sido comprovado.
Art. 530. Não havendo estipulação em contrário, o pagamento deve ser efetuado na data e no lugar da entrega dos documentos.
Art. 531. Se entre os documentos entregues ao comprador figurar apólice de seguro que cubra os riscos do transporte, correm estes à conta do comprador, salvo se, ao ser concluído o contrato, tivesse o vendedor ciência da perda ou avaria da coisa.
Art. 532. Estipulado o pagamento por intermédio de estabelecimento bancário, caberá a este efetuá-lo contra a entrega dos documentos, sem obrigação de verificar a coisa vendida, pela qual não responde.
Parágrafo único. Nesse caso, somente após a recusa do estabelecimento bancário a efetuar o pagamento, poderá o vendedor pretendê-lo, diretamente do comprador.



6.4 Cláusula de venda com reserva de domínio (pactum reservati dominii)

a.     Conceito

     Por meio dessa cláusula, o vendedor mantém o domínio da coisa até que o preço seja pago de forma integral pelo comprador.

b.     Características

- A coisa deve ser móvel e infungível (exemplo: veículos);
- O comprador recebe a mera posse direta do bem;
- A propriedade do vendedor é resolúvel a partir do pagamento integral do preço (evento futuro e incerto);
- O comprador responde pelos riscos da coisa, a partir de quando lhe é entregue (res perit emptoris);

c.      Formalidade

- Estipulação por escrito
- Registro no Cartório de Títulos e Documentos do domicílio do comprador;

d.      Mora ou inadimplemento do comprador

- O vendedor pode promover ação de cobrança das parcelas vencidas e vincendas e o mais que he for devido;

- O vendedor pode recuperar a posse da coisa vendida, por meio da ação de busca e apreensão;

e. Diferenças: reserva de domínio x alienação fiduciária x leasing 

CLÁUSULA DE VENDA COM RESERVA DE DOMÍNIO
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA
LEASING OU ARRENDAMENTO MERCANTIL
Natureza jurídica: cláusula especial da compra e venda;
Natureza jurídica: Direito real de garantia sobre coisa própria;
Natureza jurídica: Contrato típico ou atípico
- Vendedor: mantém o domínio;
- Comprador: tem a posse direta da coisa alienada;
- Comprador adquire a propriedade ao pagar as parcelas integralmente
- Devedor fiduciante: compra o bem de um terceiro;
- Credor fiduciário: tem a propriedade do bem;
- Propriedade é resolúvel, extingui-se se o preço for pago integralmente pelo devedor fiduciante;


- Locação com opção de compra;
- Pagamento do VRG (valor residual garantido)
- Ação cabível para reaver a coisa é a busca e apreensão;
- Não cabe prisão civil;
- Ação cabível para reaver a coisa móvel é a busca e apreensão;
- Não cabe prisão civil;
- Ação cabível para reaver a coisa é a reintegração de posse;
- Não cabe prisão civil se a coisa não for devolvida;


CC, Da Venda com Reserva de Domínio
Art. 521. Na venda de coisa móvel, pode o vendedor reservar para si a propriedade, até que o preço esteja integralmente pago.
Art. 522. A cláusula de reserva de domínio será estipulada por escrito e depende de registro no domicílio do comprador para valer contra terceiros.
Art. 523. Não pode ser objeto de venda com reserva de domínio a coisa insuscetível de caracterização perfeita, para estremá-la de outras congêneres. Na dúvida, decide-se a favor do terceiro adquirente de boa-fé.
Art. 524. A transferência de propriedade ao comprador dá-se no momento em que o preço esteja integralmente pago. Todavia, pelos riscos da coisa responde o comprador, a partir de quando lhe foi entregue.
Art. 525. O vendedor somente poderá executar a cláusula de reserva de domínio após constituir o comprador em mora, mediante protesto do título ou interpelação judicial.
Art. 526. Verificada a mora do comprador, poderá o vendedor mover contra ele a competente ação de cobrança das prestações vencidas e vincendas e o mais que lhe for devido; ou poderá recuperar a posse da coisa vendida.
Art. 527. Na segunda hipótese do artigo antecedente, é facultado ao vendedor reter as prestações pagas até o necessário para cobrir a depreciação da coisa, as despesas feitas e o mais que de direito lhe for devido. O excedente será devolvido ao comprador; e o que faltar lhe será cobrado, tudo na forma da lei processual.
Art. 528. Se o vendedor receber o pagamento à vista, ou, posteriormente, mediante financiamento de instituição do mercado de capitais, a esta caberá exercer os direitos e ações decorrentes do contrato, a benefício de qualquer outro. A operação financeira e a respectiva ciência do comprador constarão do registro do contrato.


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  • Síntese:
TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 3ª ed. rev., atual. e ampl. Capítulo 6, págs. 637 a 655. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013.

Bons estudos!

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