terça-feira, 3 de setembro de 2013

Hermenêutica - Aula 06 - Hermenêutica sacra: Escola protestante - Martin Lutero

A escola protestante 

     O fato gerador do rompimento de Lutero com o Catolicismo foi a tradução da bíblia para o Alemão. 

     Traduzir é passar de um código linguístico para outro. Um código linguístico nunca vai ser igual a outro. Basicamente traduzir um texto é tirar a substância de um recipiente e levar para recipiente diverso só que preservando a essência.

     Martin Lutero não fez apenas traduzir a bíblia, ele a interpretou alterando completamente o sentido, houve uma modificação no significado tão grande que fundaram outra igreja. 

     Um exemplo foi a tradução do termo 'trabalho', para Agostinho o trabalho era um sacrifício imposto por Deus, quando foi traduzido para o alemão alteraram o sentido de trabalho para uma concepção intramudana, não sendo mais concebido como um castigo, mas sim como forma de glorificação à Deus. Então, enquanto o católico vai rejeitar o lucro, o protestante vai enaltecer e reaplicar. 

     Pelo protestantismo tradicional o sujeito já está salvo ou condenado desde o início dos tempos, que é confirmado pelas atitudes durante a vida. 

     Como consequências dessa tradução por Martin Lutero, houve a quebra do monopólio sobre o conhecimento feito pela igreja, ocorreu a a vulgarização, a popularização da interpretação e também a descentralização do poder. 

     No julgamento de Martin Lutero, ele usa o texto literal da bíblia para contrapor a tradição.

      Essa contraposição é típica do método exegético da sola scriptura, a qual faz a contraposição à tradição. A manutenção do mistério e principalmente da interpretação quádrupla (de Agostinho) eram o que sustentava a tradição. 

     A partir do momento que Martim Lutero contrapõe a tradição, a bíblia passa a servir como evidência. Ele percebeu que as interpretações feita pela tradição católica justificavam posicionamentos políticos, tornando-se evidente uma desvirtuação, e por isso tentou contrapor esse desvirtuamento com a contraposição da bíblia. Tirar a ideia de alegorese e fazer interpretação puramente exegética. 

     "O espírito não está além da palavra, mas a sua concretização pela fé"

     As passagens obscuras devem ser esclarecidas, analogicamente, por passagens paralelas (analogia é método integrativo). Não fugir do texto, a analogia como técnica de interpretação é de origem exegética. 

     O problema da exegese que traz a falência do próprio método é supor que só com o texto em si teria como exaurir todos os significados. Por isso a interpretação foi reestruturada a partir de Flacius. 

     Um dos grandes pressupostos da exegese: quando a lei é clara não há o que se interpretar.

     Martin Lutero queria fazer uma reforma para separar as questões políticas da igreja. (Estado - Igreja)

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RECORTES: GRONDIN (tradução de Benno Dischiger), Introdução à hermenêutica

Lutero: sola scriptura?

Para o primeiro historiador da hermenêutica, Dilthey, era certo que a ciência hermenêutica só iniciou como protestantismo. A ação reformadora de Lutero semeou as premissas de uma revolução hermenêutica. A sua "hermenêutica" se esgota plenamente na sua interpretação da Sagrada Escritura. Como professor ele só dava lições exegéticas. Lutero era avesso à filosofia ou à teorização, que ele equiparava com uma escolástica vazia. Sua concepção hermenêutica era unicamente o seu método de exegese das Escrituras.

O seu ponto de partida era estabelecido pelo princípio reformador da sola scriptura*, que ele contrapunha à tradição e ao magistério eclesiástico. Esse princípio representava uma afronta para a Igreja daquela época, esquecida do texto. Para a Patrística valia o primado da Sagrada Escritura. Em Agostinho sempre era preciso partir das Escrituras. Opostamente à tendência alegorisante dos alexandrinos, Agostinho partia da original compreensibilidade da Sagrada Escritura. A sola scriptura bem como a clareza fundamental da Escritura já eram pilares hermenêuticos da Patrística, que Lutero não minimizava. Sua recusa da alegorese e do quádruplo sentido da Escritura significavam uma renovação provocadora da mentalidade patrística. Positivamente a rejeição da alegorese por Lutero, sinalizava uma decidida orientação para o sensus literalis*. A intenção de Lutero era que o sentido literal bem entendido já continha um significado espiritual. O espírito não é um além da palavra espiritualmente dissolvido, ele vem ao nosso encontro na concretização da palavra pela fé. O conhecido dito de Lutero, segundo o qual a Escritura seria sui ipsius interpres (sua própria chave) significa que a palavra, como auto-oferta de Deus, espera por uma concretização que, no crente, deve resultar em compreensão da Escritura.  A orientação para a palavra preenche tudo o que a Escritura tem para revelar. É esta, para o protestantismo, a forma do universalismo hermenêutico.

O princípio da sola scriptura*, que seja seu próprio intérprete, a doutrina do Verbo, que lhe subjaz, bem como a antecipação da compreensão fundamental da scriptura, não são descobertas de Lutero. A questão é se elas podem ser suficientes para a constituição de uma austera teoria da interpretação. Devido as passagens obscuras Agostinho desenvolveu as orientações hermenêuticas na Doctrina christiana. Devido a Sagrada Escritura não sempre clara e compreensível, a Igreja oficial se apoiara sobre a autoridade da tradição e do magistério eclesiástico. O apelo protestante para a inspiração do Espírito Santo, ou em Escritura que em toda parte e univocamente fosse sui ipsius interpres, repercutia insatisfatoriamente e em parte ingênua, parecia não conter a arbitrariedade de interpretações opostas. Foi fácil ao Concílio contra-reformatório de Trento (1546), reforçar a insuficiência hermenêutica das Escrituras e a necessidade de um recurso à Tradição. Com argumento de que ser artificial propor uma contradição entre a Escritura e a Tradição quando ambas brotam do mesmo Espírito Santo.

O movimento contra reformatório chamou a atenção para o ponto frágil da hermenêutica do protestantismo primevo, para a total falta de hermenêutica. O desenvolvimento de uma hermenêutica explícita tornou-se um urgente desiderata do protestantismo, que conduziu Martin Lutero ao desenvolvimento de uma hermenêutica científica da Sagrada Escritura. A primeira pessoa que aduziu uma chave hermenêutica para o esclarecimento das passagens obscuras da Escritura foi um adepto de Lutero, Matthias Flacius Illyricus (1520-1575).


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  • Referência
- GRONDIN, Jean - Introdução à hermenêutica filosófica; tradução de Benno Dischiger. São Leopoldo. Ed. UNISINUS, 1999.
- Aula 27/08/2013, Hermenêutica Jurídica, Profº Ronaldo Alencar, com anotações de Régia Carvalho
  • Leia mais
- Guerra dos 30 anos, por Pedro Augusto Rezende Rodrigues
  •  Tradução
* Sola scriptura - apenas a escritura, o que está escrito
* Sensus literalis - sentido literal
* Scriptura - escritura
* Doctrina christiana - Doutrina cristã
* Desiderata - desejo, desejado 

 Bons Estudos!

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