domingo, 7 de junho de 2015

Invalidade dos negócios jurídicos

 
1. Teoria das invalidades/ nulidades
 
     É uma espécie de “sanção” que o próprio ordenamento impõe pelo fato do negócio jurídico ter ocorrido sem o preenchimento dos devidos requisitos.
 
     Maria Helena Diniz diz que nulidade vem a ser uma sanção, imposta pela norma jurídica, que determina a privação dos efeitos jurídicos do negócio praticado em desobediência ao que prescreve (Stolze, p. 421).
 
     Invalidade é gênero do qual nulidade (absoluta) e anulabilidade (relativa) são as espécies, um negócio jurídico pode ser nulo ou anulável.
 
     Regras gerais, é como se fosse uma espécie de sanção, punição. O ordenamento estabelece regras e aí as partes contratantes compactuam negócio jurídico sem obedecer aquelas regras. Então o ordenamento jurídico prevê a invalidade do negócio realizado em desobediência à lei. Tem alguns motivo para tratar esse negócio como nulo ou anulável, mas as duas tornam inválido. A sanção vem pelo descumprimento dos pressupostos de validade do negócio jurídico.
 
     Essa nulidade, de acordo com o tipo de elemento violado, pode ser absoluta ou relativa.
 
     Ato nulo viola norma de ordem pública, de natureza cogente e ato anulável decorre da infringência de norma jurídica protetora de interesses privados.

a) Prova supletiva
 

CC, Art. 183. A invalidade do instrumento não induz a do negócio jurídico sempre que este puder provar-se por outro meio.
 
     Exemplo: digamos que uma pessoa tem vários quitinetes, e os aluga, faz contrato de locação de imóvel residencial, o instrumento desse negócio jurídico é o contrato escrito. Essa pessoa faz o contrato com um relativamente incapaz, que assina o contrato sozinho, daí sabemos que esse negócio é anulável, inválido a princípio, digamos que essa pessoa foi levada a errar, o contratante disse que era capaz. Digamos que lá na frente o inquilino ficou meses sem pagar e o proprietário foi cobra-lo, ai ele diz que o seu contrato é invalido porque ele não tinha nem idade para assinar. Mas se o proprietário puder provar de outros meios esse negócio jurídico pode ser cobrado. Esse artigo fala da prova supletória, para suprir, preencher um espaço que foi deixado pela invalidade do instrumento.

b) Princípio da conservação dos negócios jurídicos e princípio da gravitação jurídica
 

CC, Art. 184. Respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio jurídico não o prejudicará na parte válida, se esta for separável; a invalidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a destas não induz a da obrigação principal.
 
     Veja nitidamente temos nesse artigo a previsão, ainda que não expressa, desse dois princípios na primeira parte encontramos o princípio da conservação dos negócios jurídicos: sempre que for possível não desmanchar, mais sim readequar é melhor readequar; a segunda parte fala do princípio da gravitação jurídica que vai dizer que normalmente o acessório segue o principal, traz duas regras esse artigo, e com base nesse raciocínio podemos ter que uma pessoa entrar com ação revisional de contrato, que entende que determinada cláusula do contrato está com problema, não precisa pedir anulação do contrato inteiro, só da cláusula.
 
     Normalmente o acessório segue o principal: exemplo, pessoa que tem os quitinetes, e fez o contrato de locação e quem assinou foi o pai do relativamente incapaz, portanto o contrato é válido, mas o locador pediu um fiador, e o fiador foi o relativamente incapaz. A fiança é um negócio jurídico acessório, nesse caso ele é anulável, mas não contamina o principal, já o inverso não é verdade. Assim, a nulidade do contrato de penhor (acessório) não prejudica a validade da compra e venda que estava garantindo (principal).

1.1 Invalidade ou nulidade absoluta
 
     Vimos que apenas dois vícios causam nulidade: a coação física e a simulação, só que além dessas duas existem outras previstas (166, CC) que vão ser tratadas como situação que geram negócios jurídicos nulos.
 

CC, Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz; II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto; III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito; IV - não revestir a forma prescrita em lei; V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa; VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
 
     Todas as hipóteses legais mencionadas estão relacionadas com os pressupostos de validade (agente capaz e legitimado, manifestação da vontade livre e de boa-fé, forma livre ou prescrita e objeto lícito, possível e determinado ou determinável).
 
     Digamos que Raquel pede meu carro emprestado, se eu emprestar estaremos fazendo um negócio jurídico, empréstimo de bem infungível, portanto comodato. Mas se eu chegar para Raquel e disser que empresto que desde que Raquel mate um desafeto, se eu combino com ela e concorda, veja que o contrato que era lícito se torna ilícito por causa da razão determinante.
 
     Quando "for preterida alguma solenidade" em relação a forma tem que ser prescrita ou não defesa por lei esses dois artigos estão tratando do mesmo assunto, não é de forma lícita ou falta alguma forma prescrita em lei.

     Duas ou mais pessoas fazem negócio jurídico com objetivo de fraudar a lei, será considerado nulo.
 
     Quando a lei taxativamente declara nulo, temos como exemplo os artigos 548  e 426 (pacta corvina). "A lei taxativamente declarar nulo..." esse inciso VII vamos deparar que determinada situação é proibida, mas não diz que se acontecer o negócio é nulo, mas o inciso VII diz que quando declarar nulo, mas sem cominar sanção, então faz interpretação sistemática junto com o inciso VII e vai dizer que ele é nulo. O Art. 406: não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva, mas não fala de sanção, se ele proibiu mas não cominou sanção, sistematiza com o inciso VII para dizer que é nulo. Pacta corvina - negócio jurídico vier a acontecer tendo como objeto herança de pessoa viva.

a) Negócio jurídico nulo de pleno direito
 

CC, Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.
§ú. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.
 
     As nulidade podem ser alegada por qualquer interessado e são consideradas problemas de ordem pública, o negócio jurídico nulo de pleno direito são assim considerados porque são problemas graves e sérios. Ocorre violação de norma de ordem pública e com vício grave.

b) Não é passível de convalidação / confirmação
 

CC, Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.
 
     E é imprescritível a declaração de nulidade pura, deve ser repetido em novo formato válido, caso não seja possível a conversão. A sentença com efeitos ex tunc e eficácia erga omnes;
 
     Negócio jurídico nulo não convalidado nem é passível de confirmação nem convalidar, que tem a ver com passagem do tempo.
 
     Vimos que o ato anulável é mais maleável, pode ser só readequado. O negócio jurídico nulo é nulo e ponto final. Não é passivel de confirmação.
 
     O negócio jurídico nulo, assinado por absolutamente incapaz. Independentemente do momento esse negócio vai ser nulo sempre. Não se convalida. Por causa disso a ação é uma ação declaratória de nulidade. Declaratória porque em qualquer tempo vai declarar a nulidade e reconhecer. No julgamento dessa ação tem sua sentença com duas características: a eficácia erga omnes (pois tem a ver com a violação de ordem pública) e os efeitos são ex tunc (retroage os efeitos da sentença)

c) Conversão substancial 
 
    Também é medida sanatória, especialmente nos atos nulos, já que os anuláveis, podem ser convalidados ou confirmados.
 

CC, Art. 170. Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade.
 
     É outra novidade pelo legislador de 2002, fala cada conversão substancial do negócio jurídico nulo, e tem ligação com o princípio da conservação dos negócios jurídicos. Ele é considerado muito problemático, com comprometimento de forma séria, que não dá para salvar, legislador pensou: conservar não dá, mas vamos ver se não dá para fazer outra coisa para não desmanchar geral, aí essa outra coisa foi justamente essa conversão que ele pensou. Quer dizer que uma coisa vai passar a ser outra. Significa que o legislador trouxe essa opção de "salvar" o negócio jurídico nulo, essa conversão. Pegar alguma coisa dele que é aproveitável e transformar em outro negócio jurídico.
 
     Exemplo: João casado com Maria, só que o casamento deles não é muito organizado, se consideram separados de fato, e João trabalha como representante comercial, além disso ele é um homem muito amoroso e distribui o sentimento dele por onde ele passa. Numa dessas viagens na cidades que ele trabalha ele casou com Antônia. Mas ele é separado de fato de Maria. Impedimento de casamento pessoas já casadas. Se não pode e não existe cominação de sanção considera-se nulo o segundo casamento, Maria descobriu o segundo casamento e entrou com ação declaratória de nulidade, na audiência o juiz chama os três e diz João como você faz isso? João diz que já estava separado de fato, nem se considera casado. Maria diz que no papel eu sou mulher dele. Realmente esse casamento de vocês é nulo, mas me diga se vocês João e Maria, que já estão separados, e João e Antônia querem ficar juntos. O casamento entre João e Antônia não dá para salvar porque é nulo mas o juiz pode converter em união estável válida.

1.2 Anulabilidade, invalidade, nulidade relativa 
 
     Negócio jurídico anulável ocorre na violação a norma protetora de interesses privados. “além dos casos expressamente declarados na lei”, ex: CC, arts. 1.647 e 1.649.
 

CC, Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico: I - por incapacidade relativa do agente; II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.
 
     Anulável por incapacidade do agente ou parte absolutamente incapaz agindo sozinha gera ato anulável. Por vício de erro, dolo, coação, estado de perigo...  coação entender como moral, porque está falando em anulável.

a) Convalidação ou confirmação 
 
     Através das chamadas medidas sanatórias, desde que não prejudique terceiro de boa-fé.
 

CC, Art. 172. O negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito de terceiro.
CC, Art. 173. O ato de confirmação deve conter a substância do negócio celebrado e a vontade expressa de mantê-lo.
 
     Negócio anulável pode ser confirmado pelas partes. É justamente o contrário do que falamos do negócio jurídico nulo, o anulável é passível de confirmação e convalidação. O assistente do absolutamente incapaz vir e assinar para confirmar o negócio.

b) Arguida pelos interessados
 

CC, Art. 177. A anulabilidade não tem efeito antes de julgada por sentença, nem se pronuncia de ofício; só os interessados a podem alegar, e aproveita exclusivamente aos que a alegarem, salvo o caso de solidariedade ou indivisibilidade.
 
     A anulabilidade não tem efeitos, só os interessados podem alegar. Os negócios jurídicos anuláveis são os que a vontade das partes interfere bastante. Se é possível as partes entrarem no consenso e não necessariamente desmanchar o negócio e sim readequar, a vontade das partes é determinante para a ação ou não, desmanche ou não desse negócio. Nesse caso a ação é anulatória, significa que ela não tem natureza declaratória, mas sim constitutiva negativa ou natureza desconstitutiva. Quando convalida o ato torna-se válido, o tempo faz a diferencia. A sentença tem eficácia inter parte e efeitos ex nunc (da sentença para frente). Alguns doutrinadores, não maioria, defendem que os efeitos aqui seriam ex tunc.

c) Ação anulatória
 
     Natureza constitutiva negativa ou desconstitutiva, com efeitos ex nunc e eficácia inter partes (CC, art. 182). “Anulado” entendido como termo genérico (nulo e anulável), efeitos ex tunc, data da realização do negócio, retorno ao status quo ante.
 

CC, Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado: I - no caso de coação, do dia em que ela cessar; II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio jurídico; III - no de atos de incapazes, do dia em que cessar a incapacidade.
 
     Ou seja, desmanchou o negócio, a tendência é que se procure fazer com que as partes retornem ao status quo anterior, por causa desse artigo 182, os doutrinadores dizem que os efeitos deveriam ser ex tunc.

     Exemplo: erro essencial de pessoa, casou com um homosexual, erro então negócio jurídico é anulável, ela teve um tempo para agir, se ela não entrar com ação anulatória ela vai perder a possibilidade de entrar com a ação e o negócio jurídico anulável vai se tornar válido, o tempo é determinante, prazo decadencial.

d) Prazo de 2 anos para pleitear 
 

CC, Art. 179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato.
 
     Esse artigo e aquela história da regra geral, o 178 fala de determinadas situações, mas podemos ter negócio jurídico anulável pelo sistema, mas o próprio sistema não dá prazo. Então se a situação não tiver no artigo 178 e não tiver previsão expressa para aquela situação aplica só o artigo 179.
 
     Exemplo: artigo 117 - salvo se permitir a lei ou representado é anulável o negócio jurídico... . Lembram do ato contrato, o artigo diz que ele é anulável, mas dá prazo, assim interpreta-se o 117 com o 179, ou seja 2 anos para entrar com ação anulatória. Não impetrar no prazo vai convalidar.
 
 
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  • Referência
Aula 2014, Profª Ana Eleonora com anotações de Régia Carvalho, UNIRN
 
GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume 1: parte geral - 11ª ed - São Paulo: Saraiva, 2009
 
 
 Bons estudos!
 
 

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