terça-feira, 4 de março de 2014

Direito Civil III - Lição 07 - Evicção


1. Definições

a)     Evicção - ato ou efeito de evencer, desapossar, despojar; dessapossar um indivíduo de uma propriedade (Dic. Michaelis); no conceito trazido por Tartuce (2013, pág. 596) a evicção é "a perda da coisa diante de uma decisão judicial ou de um ato administrativo que a atribui a um terceiro".

b)     Posse - ação ou direito de possuir a título de propriedade (Dic. Michaelis). O Código Civil (Art. 1.196) prescreve que "considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade".

     Em um contrato de locação a posse direta é do inquilino .

c)     PropriedadeO direito pelo qual uma coisa pertence a alguém; posse legal de alguma coisa (Dic. Michaelis). O Código Civil (Art. 1.228) prevê que "O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha".

     Proprietário de um bem tem três faculdades, dispor, obter frutos, usar ou gozar desse bem.É possível a posse direta e indireta da propriedade.

d)     Desapropriação - é uma das causas de perda da propriedade (CC, Art. 1.275).

e)     Usucapião - Meio de adquirir o domínio da coisa, pela sua posse continuada durante certo lapso de tempo, com o concurso dos requisitos que a lei estabelece para este fim (Dic. Michaelis). Ver arts. Art. 1.238 a 1.244 do CC.

f)     Direito de sequela - Aquele que tem o titular de um direito real de apreender o que lhe pertence e tirá-lo do poder daquele que o detém.


2. Partes na da evicção

a)     Alienante - É o que vendeu a coisa;

b)     Evicto ou adquirente -  É aquele que perdeu o bem adquirido em ação de evicção.

c)     Evictor ou terceiro -  É o ganhador em ação de evicção por decisão judicial ou ato administrativo, o real dono da coisa.


3. Requisitos da evicção (GONÇALVES, 2012)

a)     Onerosidade da aquisição

      Deve haver sacrifícios e benefícios mútuos para caracterizar a onerosidade da aquisição. Está expresso no art. 447 que é nos contratos onerosos que o alienante responde pela perda da coisa, observa-se que, em regra, o doador não está sujeito às consequências da evicção ou do vício redibitório (art. 552).

Art. 447. Nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção...

b)     Perda total ou parcial da propriedade, posse ou uso da coisa alienada

     Essa perda do bem para o real dono pode ser por Sentença judicial transitada em julgado ou por Ato administrativo.

     Na evicção parcial tem a questão de ser ou não considerável a perda (art. 455, CC) para fins de poder pleitear pela rescisão contratual e a restituição do preço correspondente ao desfalque, ou pleitear indenização correspondente à parte perdida.

     Gonçalves exemplifica explicando o que seria a perda parcial considerável: "Se, por exemplo, alguém adquire uma propriedade rural e perde uma pequena fração dela, porém justamente aquela em que se situa a casa da sede, ou o manancial de água, pode a evicção, não obstante a pouca extensão territorial subtraída, ser considerada considerável ou de grande monta, por atingir a própria finalidade econômica do objeto".

     Portanto, perda parcial considerável é aquele que atinge o que tem de essencial no contrato, sem o qual ele não existiria.

CC, Art. 455. Se parcial, mas considerável, for a evicção, poderá o evicto optar entre a rescisão do contrato e a restituição da parte do preço correspondente ao desfalque sofrido. Se não for considerável, caberá somente direito a indenização.

c)     Anterioridade do direito do evictor

     É fundamentalmente importante esclarecer se o direito do evictor é anterior ou posterior à alienação, se for posterior o alienante não terá nenhuma responsabilidade sobre a evicção.

     No exemplo da desapropriação, explicado por Gonçalves (2012), se já tiver sido expedida o decreto de desapropriação antes da alienação, o alienante responde pela evicção, já que a causa da perda é anterior ao contrato.

     No caso de usucapião, não cabe ao alienante ressarcir o adquirente se a prescrição aquisitiva ocorrer após a transmissão da coisa; a não ser que o prazo prescricional acabe muito próximo ao ato de aquisição e assim não haveria tempo que o adquirente interromper a prescrição (Caio Mário da Silva Pereira, Instituições, cit., v. III, p. 137).

d)     Ignorância pelo adquirente, da litigiosidade da coisa

     Se o adquirente sabia que a coisa era alheia ou litigiosa e assumiu o risco (contrato aleatório), não há responsabilidade para o alienante.

     Porém, se o adquirente não assumiu o risco informado, receberá o preço que pagou pela coisa evicta, sem direito a perdas e danos.

     "Pondera, todavia, João Luiz Alves: “Cumpre, porém, notar que, mesmo sabendo que a coisa era alheia ou litigiosa, não tendo direito à garantia, tem contudo, o adquirente evicto, direito à restituição do preço, salvo se assumiu o risco que conhecia, porque o preço não faz parte da garantia” " (Código Civil da República dos Estados Unidos do Brasil anotado, v. 3, p. 759 apud GONÇALVES, 2012).

CC, Art. 449. Não obstante a cláusula que exclui a garantia contra a evicção, se esta se der, tem direito o evicto a receber o preço que pagou pela coisa evicta, se não soube do risco da evicção, ou, dele informado, não o assumiu.
CC, Art. 457. Não pode o adquirente demandar pela evicção, se sabia que a coisa era alheia ou litigiosa.

e)     Denunciação a lide  

     É uma questão da intervenção de terceiros, prevista no art. 70 do CPC, na qual chama-se ao processo o alienante, para ocupar pólo passivo.

     A doutrina já se posicionou no sentido de que se o adquirente não fizesse denunciação à lide não poderia exercer o direito de evicção em uma ação autônoma, mas Gonçalves (2012) continua explicando que "Aos poucos, no entanto, outra corrente foi-se formando, sustentando a admissibilidade da ação autônoma, como indenização pela prática de verdadeiro ilícito, fundada no princípio que veda o enriquecimento sem causa. Esta última acabou prevalecendo no Superior Tribunal de Justiça, que tem a função de uniformizar a jurisprudência no País". 

CPC, Art. 70. A denunciação da lide é obrigatória: I - ao alienante, na ação em que terceiro reivindica a coisa, cujo domínio foi transferido à parte, a fim de que esta possa exercer o direito que da evicção lhe resulta; 
CC, Art. 456. Para poder exercitar o direito que da evicção lhe resulta, o adquirente notificará do litígio o alienante imediato, ou qualquer dos anteriores, quando e como lhe determinarem as leis do processo. 
Parágrafo único. Não atendendo o alienante à denunciação da lide, e sendo manifesta a procedência da evicção, pode o adquirente deixar de oferecer contestação, ou usar de recursos.

4. Cláusula de irresponsabilidade

     Ocorrendo a evicção, o alienante tem a responsabilidade de ressarcir os prejuízos do adquirente. Mas conforme art. 448, CC, as partes podem convencionar uma diminuição, reforço ou até mesmo a exclusão da responsabilidade pela evicção.

a)     Reforço

     A evicção pode ser reforçada por cláusula expressa, como por exemplo, restituição em dobro ou fiança.

     "Entende Silvio Rodrigues que se deve entender que a lei não permite reforço ilimitado da garantia, não podendo, em princípio, a responsabilidade do alienante superar o prejuízo do adquirente [...]" (RODRIGUES, Direito civil, v. 3, p. 115. apud GONÇALVES, 2012).

d)     Redução

       É a possibilidade de as partes convencionarem que nos caso de evicção da coisa o alienante ressarce o adquirente um valor a menor.

c)      Exclusão  [Non Praestanda Evictione (ver art. 449 CC)]

     Só se admite exclusão de garantia por cláusula expressa no contrato. Se o adquirente concordar assumirá todo o risco da evicção.

     "Só se excluirá a responsabilidade do alienante se houver cláusula expressa (pactum de non praestanda evictione), não se admitindo cláusula tácita de não garantia. [...]" (GONÇALVES, 2012).  

     Em complemento, "se a cláusula excludente da responsabilidade for genérica, sem que o adquirente saiba da ameaça específica que recai sobre a coisa, ou se dela informado não assumiu o risco, não se exonera o alienante da obrigação de restituir o preço recebido" (GONÇALVES, 2012). 

     No mesmo sentido Maria Helena Diniz afirma que as partes podem convencionar pela "[...]Completa isenção de responsabilidade pela evicção, de caráter indenizatório, o que não exclui a responsabilidade do alienante pela devolução do preço (Art. 449 do NCC), salvo se o adquirente, informado do risco da evicção, o assumiu (art. 449, in fine, do NCC) (DINIZ, [?], pág. 242). 



CC, Art. 448. Podem as partes, por cláusula expressa, reforçar, diminuir ou excluir a responsabilidade pela evicção.

5. Hasta Pública  

     Mesmo em hasta pública subsiste a garantia ao adquirente no caso de evicção. Deve ser pleiteado junto ao executado e subsidiariamente ao exequente.

     "O Código de 2002 apresenta uma inovação no art. 447 retrotranscrito, dispondo que subsiste a garantia da evicção “ainda que a aquisição se tenha realizado em hasta pública”. A dúvida que o dispositivo suscita, não dirimida pelo Código, consiste em saber quem responde pela evicção, tendo em vista que a venda não se dá de modo espontâneo pelo proprietário da coisa, mas forçado, pelo Estado, a fim de que terceiro seja favorecido" (GONÇALVES, 2012).

     "Parece-nos que o arrematante ou adjudicante que sofreu a evicção total ou parcial pode exigir a restituição do preço da coisa evicta, ou o valor do desfalque, voltando-se contra o credor ou credores que se beneficiaram com o produto da arrematação, ou contra o devedor-executado, proprietário do bem, se este recebeu saldo remanescente" (Nessa linha o pensamento de Pontes de Miranda (Tratado de direito privado, v. 38, p. 181) e Sílvio Venosa (Direito civil, cit., v. II, p. 573) apud GONÇALVES, 2012). 


6. Montante da prestação Devida ao Evicto

     "O Superior Tribunal de Justiça, afinado com esse entendimento, tem proclamado: “Perdida a propriedade do bem, o evicto há de ser indenizado com importância que lhe propicie adquirir outro equivalente. Não constitui reparação completa a simples devolução do que foi pago, ainda que com correção monetária”" (REsp 248.423-MG, 3ª T., rel. Min. Eduardo Ribeiro apud GONÇALVES, 2012).

     O adquirente terá direito de receber tudo que dispendeu para adquiri a coisa, a lém das verbas citadas no art. 450. A contar da data que sofreu a evicção, da data que perdeu o bem mais as custas de indenização, podendo cumular contra o alienante.

     "A deterioração da coisa, em poder do adquirente, não afasta a responsabilidade do alienante, que responde pela evicção total, salvo em caso de deterioração do bem provocada intencionalmente por aquele" (GONÇALVES, 2012).

CC, Art. 450. Salvo estipulação em contrário, tem direito o evicto, além da restituição integral do preço ou das quantias que pagou:
I - à indenização dos frutos que tiver sido obrigado a restituir;
II - à indenização pelas despesas dos contratos e pelos prejuízos que diretamente resultarem da evicção;
III - às custas judiciais e aos honorários do advogado por ele constituído.
Parágrafo único. O preço, seja a evicção total ou parcial, será o do valor da coisa, na época em que se evenceu, e proporcional ao desfalque sofrido, no caso de evicção parcial.
Art. 451. Subsiste para o alienante esta obrigação, ainda que a coisa alienada esteja deteriorada, exceto havendo dolo do adquirente. 
Art. 452. Se o adquirente tiver auferido vantagens das deteriorações, e não tiver sido condenado a indenizá-las, o valor das vantagens será deduzido da quantia que lhe houver de dar o alienante. 

7. Benfeitorias  

     "O evicto, como qualquer possuidor, tem direito de ser indenizado das benfeitorias necessárias e úteis, pelo reivindicante (CC, art. 1.219). Contudo, se lhe foram abonadas (pagas pelo reivindicante) e tiverem sido feitas, na verdade, pelo alienante, “o valor delas será levado em conta na restituição devida” (CC, art. 454). A finalidade da regra é evitar o enriquecimento sem causa do evicto, impedindo que embolse o pagamento, efetuado pelo reivindicante, de benfeitorias feitas pelo alienante" (GONÇALVES, 2012).

CC, Art. 453. As benfeitorias necessárias ou úteis, não abonadas ao que sofreu a evicção, serão pagas pelo alienante.
Art. 454. Se as benfeitorias abonadas ao que sofreu a evicção tiverem sido feitas pelo alienante, o valor delas será levado em conta na restituição devida. 

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  • Referência
- Aula 18/02/2014, Direito Civil III (Contratos), Profª Gabryella Simonetti, com anotações de Régia Carvalho.
- GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 3: teoria dos contratos e atos unilaterais. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
- LEITE, Gisele Pereira Jorge. Vício redibitório e evicção. 201. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2210>. Acesso em: 04 mar. 2014.

Bons estudos!

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