5.3 PRINCÍPIOS CONTRATUAIS NO CÓDIGO CIVIL DE 2002
5.3.1 Primeiras palavras
Os princípios assume um papel de grande importância na atual codificação privada brasileira.
Princípios são regramentos básicos aplicáveis a um determinado
instituto jurídico, no caso em questão, aos contratos. Os princípios são
abstraídos das normas, dos costumes, da doutrina, da jurisprudência e
de aspectos políticos, econômicos e sociais. O princípio da função
social é expresso no Código Civil (art. 421 e 2.035, parágrafo único),
mas implícito ao Código de Defesa do Consumidor e à CLT.
É de se concordar plenamente com a apregoada aproximação
principiológica entre as duas leis, o que gera adesão imediata à teoria
do diálogo das fontes, que decorre substancialmente dos princípios
sociais contratuais encampados pela nova codificação, quais seja a
função social dos contratos e a boa-fé objetiva. Enunciado n 167
CFJ/STJ, III Jornada de Direito Civil: "Como o advento do Código Civil
de 2002, houve forte aproximação principiológica entre esse Código e o
Código de Defesa do Consumidor, no que respeita à regulação contratual,
uma vez que ambos são incorporados de uma nova teoria geral dos
contratos".
Os
princípios do Direito Civil Constitucional, que devem ser aplicados aos
contratos, são a valorização da dignidade da pessoa humana (art. 1º,
III, CF/88). a solidariedade social (art. 3º, I, CF/88) e a igualdade lato sensu ou isonomia (art. 5º, caput, CF/88).
5.3.2 Princípio da autonomia privada
O contrato está situado no âmbito dos direitos pessoais, sendo
inafastável a grande importância da vontade sobre o instituto, eis que
se trata do negócio jurídico por excelência. Entre os clássicos, leciona
Carvalho de Mendonça que o domínio da vontade dos contratantes foi uma
conquista advinda de um lento processo histórico, culminando com o
"respeito à palavra dada", principal herança dos contratos romanos e
expressão propulsora da ideia central de contrato como fonte
obrigacional".
A liberdade de contratar
está relacionada com a escolha da pessoa ou das pessoas com quem o
negócio será celebrado, sendo uma liberdade plena, em regra. Entretanto
existem limitações à carga volitiva, por exemplo, não se pode contratar
como Poder Púbico se não houver autorização para tanto. Art. 497 do CC
veda a compra e venda de bens confiados à administração em algumas
situações.
A
autonomia da pessoa pode estar relacionada com o conteúdo do negócio
jurídico, ponto em que residem limitações ainda maiores à liberdade da
pessoa humana. Trata-se da liberdade contratual.
Dessa dupla liberdade da pessoa é que decorre a autonomia privada, que
constitui a liberdade que a pessoa tem para regular os próprios
interesses.
Essa autonomia não é absoluta, encontrando limitações em normas de ordem pública e nos princípios sociais.
Entre os autores nacionais, quem observou muito bem o significado do
princípio da autonomia privada foi Francisco Amaral, sendo interessante
transcrever as suas palavras:
"A
autonomia privada é o poder que os particulares têm de regular, pelo
exercício de sua própria vontade, as relações que participam,
estabelecendo-lhe o conteúdo e a respectiva disciplina jurídica.
Sinônimo de autonomia da vontade para grande parte da doutrina
contemporânea, com ela porém não se confunde, existindo entre ambas
sensível diferença. A expressão 'autonomia da vontade' tem uma conotação
subjetiva, psicológica, enquanto a autonomia privada marca o poder da
vontade no direito de um modo objetivo, concreto e real".
Não se pode esquecer que o principal campo de atuação do princípio da
autonomia privada é o patrimonial, onde se situam os contratos como
ponto central do Direito Privado. Esse princípio traz limitações, como a
eficácia social, havendo clara relação entre o preceito aqui estudado e
o princípio da função social dos contratos, o qual não elimina a
autonomia privada ou a liberdade contratual, mas apenas atenua ou reduz o
alcance desse princípio (Enunciado n. 23 CJF/STJ, I Jornada de Direito
Civil).
O contrato de hoje é constituído por uma soma de fatores, e não mais pela vontade pura
dos contratantes, delineando-se o significado do princípio da autonomia
privada, pois outros elementos de cunho particular irão influenciar o
conteúdo do negócio jurídico patrimonial. Na formação do contrato
percebe-se a imposição de cláusulas pela lei ou pelo Estado, o que nos
leva ao caminho sem volta da intervenção estatal nos contratos ou dirigismo contratual.
Muitas vezes a supremacia econômica de uma pessoa sobre outra irá fazer
com que uma parte economicamente mais forte dite as regras contratuais.
Na prática predominam os contratos de adesão, ou contratos standard.
Do ponto de vista prático e da realidade, essa é a principal razão pela
qual se pode afirmar que a autonomia da vontade não é mais princípio
contratual. A vontade tem um papel secundário, resumindo-se em um sim ou não como resposta a uma proposta de contratação.
Conceitua-se o princípio da autonomia privada como sendo um regramento básico, de ordem particular - mas influenciado por normas de ordem pública - pelo qual na formação do contrato, além da vontade das partes, entram em cena outros fatores: psicológicos, políticos, econômicos e sociais. Trata-se do direito indeclinável da parte de autorregulamentar os seus interesses, decorrente da dignidade humana, mas que encontra limitações em normas de ordem pública particularmente nos princípios sociais contratuais.
As normas restritivas da autonomia privada constituem exceção, não
admitem analogia ou interpretação extensiva. Em situações de dúvida
entre a proteção da liberdade da pessoa humana e os interesses
patrimoniais, deve prevalecer a primeira.
Eventualmente uma norma restritiva da autonomia privada pode admitir a
interpretação extensiva ou a analogia, visando proteger a parte
vulnerável da relação negocial, caso do trabalhador, do consumidor e do
aderente.
5.3.3 Princípio da função social dos contratos
Em breve.
5.3.4 Princípio da força obrigatória do contrato (pacta sunt servanda)
Decorre da ideia clássica de autonomia da vontade, a força obrigatória
dos contratos preconiza que tem força de lei o estipulado pelas partes
na avença, constrangendo os contratantes ao cumprimento do conteúdo
completo do negócio jurídico. Esse princípio importa em autêntica
restrição da liberdade, que se tornou limitada para aqueles que
contrataram a partir do momento em que vieram a formar o contrato
consensualmente e dotados de vontade autônoma.
Não há previsão expressa desse princípio no atual Código Civil.
Todavia, os arts. 389, 390 e 391 afastam qualquer dúvida quanto à
manutenção da obrigatoriedade das convenções como princípio do
ordenamento jurídico privado brasileiro.
O princípio da força obrigatória como regra máxima tinha previsão já no
direito romano, segundo o qual deveria prevalecer o pacta sunt servanda. Não poderia ser o contrato revisto ou extinto, sob pena de acarretar insegurança jurídica no sistema.
Na realidade jurídica e fática do mundo capitalista e pós-moderno não possibilita mais a concepção estanque do contrato. Vive-se a prevalência maciça dos contratos de adesão, com conteúdo pré-estipulado.
A força obrigatória constitui exceção à regra geral da sociedade,
secundária à função social do contrato, princípio que impera dentro da
nova realidade do direito privado contemporâneo. O princípio em questão
está mitigado ou relativizado, sobretudo pelos princípios sociais da função social do contrato e da boa-fé objetiva.
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